Emergência dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada como resistência à ditadura militar sob a perspectiva da dialética de Hegel.

Pequeno ensaio produzido pelo aluno de Mestrado Acadêmico João Vitor Libório da Silva

A ditadura militar marcou um período de 21 anos (1964 a 1985) no qual os militares comandaram o país e os direitos políticos e civis dos cidadãos foram cerceados. Esse ínterim marcou a cisão entre uma sociedade pré-1964, democrata social burguesa, para uma sociedade marcada pela opressão e concentração do poder na junta militar. Em oposição à opressão, o período foi marcado pela emergência de movimentos sociais e da sociedade civil organizada que lutavam pelos direitos fundamentais até então suprimidos. O levante popular, à época designado “processo constituinte de 1987/1988”, foi marcado pela ampla participação popular nos processos de debate e redação da então nova carta magna. Nesse contexto, meu argumento nesse short paper será: “Análise da emergência dos movimentos sociais e do (re)ssurgimento da sociedade civil, como resposta ao regime ditatorial, sob a ótica do processo dialético de Hegel.”
Movimentos Sociais na luta pelos direitos
A dialética é destacada pela compreensão da realidade por meio de um processo marcado por três principais momentos colocados por Hegel – autor idealista, diferentemente do também autor dialético Marx, o qual é materialista. Como assinala Foulquié (1978) esses momentos são: a tese (afirmação), a antítese (negação) e a síntese (negação da negação). Nesta última, os dois principais momentos são
Quem quer algo de grande, deve saber limitar-se.
Quem, pelo contrário, tudo quer, nada, em verdade,
quer e nada consegue - Hegel.
conservados num processo de integração marcado pelo movimento dos argumentos/ideias. Dessa forma, não há verdade estanque, ou seja, aquela que não possa ser refutada ou agregada com novos elementos. Sendo assim, a realidade é representada pelo movimento de ideias, que em certa medida são contrapostas com antíteses, formando assim novas sínteses e ideias, que suscitam outras novas. Essa característica peculiar, o movimento das ideias que fazem as coisas mudarem, é crucial no argumento de Hegel.

O período militar, ao mesmo tempo que foi caracterizado pela forte opressão e ditadura, marcou também a emergência da rearticulação da sociedade civil no levantamento e acompanhamento de vários projetos sociais que lutavam pela retomada da democracia e dos direitos fundamentais. Dentro do contexto teórico abordado anteriormente, põe-se em discussão os movimentos sociais como antítese ao regime militar predominante até os anos de 1980. Isso se dá principalmente pelo fato dos movimentos oriundos de grupos sociais, à época, fazerem oposição ao regime militar, caracterizado como tese, por ser algo estabelecido, vigente e normatizado (por meio da opressão).

O processo de dialética é predominantemente marcado pela contradição, como assinala Foulquié (1978). Sendo a contradição o mais profundo e essencial elemento do processo, pois é por meio dele que haverá o movimento das ideias e a antítese se forma, através do choque entre tese e antítese. Em consonância a esse pensamento, Gurvitch (1987) assinala que nenhum elemento no processo da dialética é idêntico a si mesmo. Sendo assim, o levante popular da sociedade civil pela conquista de direitos democráticos demonstra uma contradição clara que, dentro de um cenário de luta, suscitou no acompanhamento e elaboração da Constituição Federal de 1988. Esta foi nomeada como Constituição Cidadã justamente por ter sido elaborada com ampla participação da sociedade civil. 

Nesse processo, a Carta Magna de 1988 pode ser vista como uma síntese ou resultado da interação entre elementos contrários – a ditadura militar e os grupos sociais. O movimento da dialética é justamente o que permite constatar que esse curso de formação da realidade por meio das ideias e pensamento não é um processo efêmero. Sendo assim, apesar da síntese expressar-se por meio da pronulgação da CF/88, esse processo pela busca de direitos é incessante, pois a todo momento terão novas teses e novas ideias para contrapor (antíteses).

                                              Participação popular na construção da Carta Magna

Referências
FOULQUIÉ, P. A dialética. Lisboa: Europa-América, 1978, p 42-66.
GURVITCH, G. Caracterização prévia da dialética. In: Dialética e sociologia. São Paulo: Vértice, 1987, p. 29-32.

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