Pequeno ensaio produzido pelo acadêmico Leonardo Quadros Schroeder Pontes.
O autor Edmund Husserl (2008), ao abordar o tema de maneira mais detida, possuía como intento compreender os fatos ocorridos no mundo como fenômenos e, para tanto, descreve um método que entende a fenomenologia com um retorno a consciência inicial, cujos autores e pesquisadores permanecem esvaziados de preconceitos e crenças, buscando questionar as certezas definidas e perguntar sobre aquilo que parece evidente, visando a essência do fenômeno. A essa essência, chega-se através de método chamado redução fenomenológica, buscando questionar e fazer uma análise crítica para a busca da essência e retorno à consciência.
De maneira bastante clara, ao dissertar sobre o primeiro grau da consideração fenomenológica, aborda a questão do conhecimento e a dificuldade em negá-lo, mas sim, questiona as realizações que lhe são atribuídas, ou seja, o conhecimento é o próprio ponto de partida das incertezas postas e, assim, há dificuldade em deixá-lo de lado, mas, seu resultado prático é questionável. Partindo para uma reflexão gnoseológica, entende-se que seria inquestionável o conhecimento, mas, por outro lado, há questionabilidade destes quando há uma propensão a dúvida, isto é, a falta de certeza absoluta. Na prática, pode se enxergar essa realidade no tribunal do júri, quando apesar da produção de prova robusta e embasado por vezes em conhecimento científico de produção de provas, torna-se o conhecimento objeto de dúvida dos jurados, cuja função neste caso, seria absolver o réu, diante de uma percepção diversa dos julgadores em relação aos produtores de provas.
Fonte: https://www.ex-isto.com/2018/08/fenomenologia-pratica-psicoterapia.html |
Penso que um aspecto interessante trazido pelo autor, é o que chama de fenomenologia transcendental, cujo valores sedimentam-se na consciência pela consciência, compreendendo os fenômenos em duplo sentido, quais sejam: no sentido da aparência e, por outro lado, no sentido da objetividade que se desconecta de toda posição empírica estabelecida. Porém, ainda que busquemos essa reflexão e entender o mundo como fenômenos ausentes de vieses de compreensão daquilo que é posto a nossa apreciação, de maneira acertada o autor Schutz (2002) faz importante destaque sobre aparência, objetividade e rompimento com posições empíricas, pois revela que as coisas até então pensadas e postas para a realidade não podem ser confrontadas quando não há argumentos ou fatos divergentes que possam fundamentar o questionamento da primeira, ou seja, ainda que valores de consciência sejam reflexivos e valorosos para percepção e construção de nova realidade, apenas isso por si só não teria o condão de modificar uma coisa pensada.
A concepção de real e irreal parte-se de dois aspectos mentais. O primeiro deles é que todos somos capazes de conceber o mesmo objeto de formas diferentes e, que podemos escolher a forma que queremos pensar aderindo a um lado ou outro. Atualmente, percebo que essa concepção divergente e percepção de realidade estão bem aparentes no cenário político, cuja escrita em livro do filósofo americano Thomas Sowell (, revela-se muito claramente as formas de percepção de mundo e seu entendimento de modo restrito ou irrestrito, deixando evidente que as convicções de formação do ser humano quando construídas por longo período de maneira inquestionável, o torna incapaz de perceber o outro lado e partir para uma negação absoluta do viés contrário, não obstante provas ou formas que o conferem a nova realidade, ou seja, a total impossibilidade de fazer uma análise de consciência e entender o mundo como fenômeno, ausente de crenças primeiras. Inclusive, traz em seu livro uma citação de Bertrand Russel, que afirma: “todo homem, aonde quer que vá, está cercado por uma nuvem de convicções que o acompanha como moscas em um dia de verão.”
A abordagem trazida no texto de Dom Quixote fala exatamente disso, como podemos nós e o próprio personagem manter nossas crenças em um universo fechado que escolhemos como ser nosso reduto de conhecimento e ideologia, quando sofremos diariamente diversas disrupções que transcendem nossas experiências. A bem da verdade, como aconteceu com Dom Quixote no seu mundo da cavalaria, quando nos confortamos com determinado posicionamento em permanecemos lá inabalável e inquestionável, não nos levamos a um exame de consciência para entender os demais fenômenos que nos cercam e, mantemos a base de pensar conforme o tempo, local e causalidade. Parece bastante real a mensagem que traz o texto quanto a expressão da atividade humana na atualidade e, naturalmente as várias facetas adotadas conforme as particularidades vivenciadas. Dom Quixote, também se caracteriza por adotar em cada uma de suas expedições maneiras totalmente diferentes de agir conforme seu mundo particular e, assim como no nosso mundo real, experiências comuns referentes aos mesmos objetos podem trazer experiências diversas, cuja bolha impenetrável que vivemos não nos permite ver o outro lado, fato este que ocorre diuturnamente e nem se apercebemos da falta de reflexão e compreensão de mundo do outro.
Assim, penso que toda essa estrutura intrincada de pensamentos, experiências, crenças, reflexões de consciências, passam necessariamente pelo que Schutz (1979) afirma ser a Filosofia Fenomenológica, cuja análise filosófica ultrapassa os métodos das ciências sociais para responder determinadas questões que envolvem o outro ser social, sua cultura, língua e forma de agir e pensar, partindo de uma percepção psicológica da consciência pessoal e compreensão da reflexão. Por fim, creio que em uma realidade separatista e difusa como estamos vivendo, onde as mais variadas fontes de informação são tomadas como verdade absoluta e, havendo interesses de pessoas e governos na manutenção do “status quo”, não vislumbro num curto prazo o exame de consciência necessário para que possamos entender e desenvolver uma sociedade mais justa e solidária, e que atenda o interesse da maioria mediante uma reflexão social.
Referências bibliográficas:
HUSSERL, E. A ideia da fenomenologia. Lisboa: Edições 70, 2008. Trechos selecionados.
SCHUTZ, A. Fundamentos da Fenomenologia. In: WAGNER, H. R Sobre fenomenologia e Relações Sociais. Textos Escolhidos e Alfred Schütz. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
SCHUTZ, A. Don Quixote e o Problema da Realidade In: LIMA, L. C. Teoria da literatura e suas fontes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
SOWELL, T. Conflito de Visões: origens ideológicas das lutas políticas. São Paulo: Realizações, 2012.
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