Pequeno ensaio produzido pelo acadêmico Lucas Sell Romão.
Este
paper busca observar a relação entre a fenomenologia, que se concentra na
análise da experiência subjetiva de como os indivíduos percebem e interpretam o
mundo ao seu redor, e o esporte, uma área que envolve o exercício físico,
consciência corporal, treinamento e competição. A fenomenologia pode oferecer
insights valiosos sobre como a prática esportiva afeta a experiência pessoal e
subjetiva dos atletas, bem como sua consciência corporal e as implicações para
o desempenho esportivo.
Fenomenologia
significa discurso sobre aquilo que se mostra como é. Daí a ênfase no sujeito e
a preocupação em identificar os objetos da consciência. Schütz (1979), Husserl
(2008), compreendem que o fenômeno é tudo aquilo que possui vivência, o
aparecer e o que aparece. Husserl (2008), acredita que a máxima da
fenomenologia é voltar as próprias coisas. Os fenômenos captados da consciência
exteriorizam as experiências, a verdade, o como as coisas são feitas. Na
fenomenologia não há pressuposições, parte-se do zero e a ênfase é centrada no
sujeito.
Silva
(2014), discute o esporte a partir da dimensão do vivido, buscando compreender
os significados conferidos à prática esportiva e à experiência do atleta. Carvalho
(2009), observa que para o senso comum, os esportes significam qualquer forma
de exercício físico ou diversão, mas, para os estudiosos é muito mais do que
isso, sendo um fenômeno humano que constitui um conjunto social e cultural e
deve ser analisado como um sistema de normas, valores e representações que se
difunde na sociedade de diversas formas. Dessa maneira, a experiência do atleta
desempenha um papel fundamental no esporte, sendo importante saber como o
atleta vivencia e sente seu próprio corpo durante a atividade esportiva.
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Kunz
(2007), acredita que a experiência é a sensibilidade que os atletas precisam
ter quanto ao ritmo, precisão, elasticidade, fluência, harmonia, enfim, em
relação a um estilo próprio, que define a qualidade dos movimentos realizados. Alguns
atletas descrevem uma sensação de fusão entre corpo e mente, o que implica que
o corpo não é apenas um objeto que executa ações, mas uma parte integrante da
experiência do atleta. Assim, a fenomenologia pode ajudar a desvendar como os
atletas vivenciam o movimento, o esforço e a propriocepção durante a prática
esportiva.
Para
Merleau-Ponty (2011), um movimento é aprendido quando o corpo compreende, quer
dizer, quando ele o incorporou ao seu mundo. Quando o corpo aprende o
movimento, não é preciso mais pensar nos detalhes para realizá-lo. O gesto
técnico deixa de ser desconhecido, nos misturamos a ele e fundamo-nos
corporalmente. Atletas desenvolvem uma percepção aguçada de seu ambiente, bem
como de seus próprios corpos e das interações com outros atletas.
Silva
(2014), exemplifica que, quando um atleta recebe a bola no ataque, precisa olhar
rapidamente para saber onde está posicionado, a qual distância está do gol,
onde se encontra o adversário mais próximo e decidir se é possível o passe, o
drible, ou mesmo o gol. Entretanto, quando adquirimos experiência, o saber
adquirido pelo corpo dirige à situação requerida de maneira rápida e precisa.
Não é mais necessário olhar fixamente para a bola, o posicionamento dos
adversários, nem a cor dos uniformes daqueles que nos rodeiam. Depois de alguns
anos, basta sentir o jogo, ver com um só olhar tudo e todos ao mesmo tempo. Com
isso, a atenção e a tomada de decisão desempenham um papel crítico no
desempenho esportivo, e a fenomenologia ajuda a analisar como os atletas
processam informações sensoriais e respondem a elas de maneira consciente.
Polanyi
e Prosch (1975), observam também que os atletas possuem outra forma de conhecimento
de seu corpo que raramente é levada em conta, sendo ele, um conhecimento
incorporado às capacidades afetivas, motoras, cognitivas e verbais. Esse
conjunto de habilidades é desenvolvido pelo atleta ao longo dos anos de
prática, tornando-o capaz de diferenciar quando está bem ou não, ainda que ele
não consiga explicar o que seja esse bem. A fenomenologia permite ainda, explorar
a experiência emocional do atleta. Como o atleta vivencia o medo, a ansiedade,
a alegria, a satisfação e outros estados emocionais.
A
compreensão da experiência subjetiva do atleta pode auxiliar no treinamento onde
os treinadores podem usar abordagens fenomenológicas para ajudar os atletas a
melhorar seu desempenho, promovendo a consciência e o controle emocional. Para Silva
(2014), a prática esportiva é composta por uma considerável tensão e excitação,
dor e prazer, anseio e emoção, sendo sem dúvida uma prática que permite ao
homem sentir e ver o mundo de forma diferente. Assim, aplicar a fenomenologia
no treinamento esportivo é interesse, visto que compreender a experiência
subjetiva dos atletas pode ser valioso para treinadores e psicólogos
esportivos, permitindo o desenvolvimento de estratégias mais eficazes para
aprimorar o desempenho e o bem-estar dos atletas.
Como
observado, a relação entre a fenomenologia e o esporte é complexa onde a
fenomenologia pode oferecer uma perspectiva valiosa para compreender a
experiência subjetiva dos atletas, destacando a importância da consciência
corporal, percepção, tempo, espaço e ação no desempenho esportivo. À medida que
essa abordagem continua a se entrelaçar com o esporte, novas oportunidades de
pesquisa e aplicação prática surgem, beneficiando tanto atletas quanto
acadêmicos interessados. Assim, a pesquisa fenomenológica no esporte pode
ajudar a melhorar o treinamento, o desempenho e o bem-estar, podendo ter
implicações práticas no desenvolvimento de estratégias de treinamento e no
apoio psicológico a atletas de todas as idades e níveis de habilidade.
REFERÊNCIAS
CARVALHO,
C. A. Psicologia e esporte: um olhar fenomenológico para um encontro
marcado pela modernidade. Rev. abordagem gestalt., Goiânia, v. 15, n.
2, p. 149-156, dez. 2009. Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672009000200011&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em 16 out. 2023
HUSSERL,
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selecionados.
KUNZ,
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l.], v. 6, n. 12, p. I-XIII, 2007. DOI: 10.22456/1982-8918.2503. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/index.php/Movimento/article/view/2503. Acesso em: 16 out.
2023
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POLANYI,
M.; PROSCH, H. (1975) Meaning. Chicago: University of Chicago Press.
SCHUTZ,
A. Fundamentos da Fenomenologia. In: WAGNER, H. R Sobre fenomenologia e
Relações Sociais. Textos Escolhidos e Alfred Shutz. Rio de Janeiro:
Zahar, 1979.
SILVA,
L. M. F. Esporte como experiência estética e educativa Esporte educativa:
uma abordagem fenomenológica. 2014. 191 f. Tese (Doutorado em Educação) -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2014.
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