Pequeno ensaio produzido pelo aluno de Mestrado Acadêmico Guilherme Maciel Mafra.
O presente paper tem o objetivo de tecer
comentários, considerações e questionamentos sobre a aula com o tema centrado nos
conflitos da própria Ciência, em especial, uma transição da ciência moderna
para a pós-moderna identificada por Boaventura de Sousa Santos (2004). Se
posicionará aqui, para tanto, que as conclusões do autor são válidas, que a
pós-modernidade trará, de fato, ganhos à Ciência. Porém, no final deste paper são levantados alguns
questionamentos sobre sua continuação como verdade.
No trabalho
“Conhecimento Prudente para uma Vida Decente”, Souza Santos (2004) e João
Arriscado Nunes (2004) demonstram uma preocupação com o status instalado atualmente na ciência. Os autores identificam e
nominam esse status atual de paradigma dominante. Neste paradigma, a ciência
estaria se fundamentando e criando bases em si mesmas sem se atentar para
outras formas de conhecimento, restringindo-se às suas próprias metodologias e
princípios, forçando a aplicação destes à busca de uma realidade/verdade
universal que só a ciência pode conferir.
As
aplicações rígidas de métodos únicos a todos os problemas invariavelmente não
trarão resultados idênticos pois os problemas não são, de mesma ordem,
idênticos. A racionalidade neste ponto de vista é extremamente mecanicista e
provavelmente encontrará resultados que não condizem com a verdade tão
simplesmente pela utilização de métodos equivocados a problemas complexos. É
demasiado perigoso por exemplo solucionar (ou buscar solucionar) problemas de
ordem social com instrumentos de ordem natural.
Essa posição
da ciência moderna, talvez prepotente, no entanto, é abalada no curso natural
da evolução humana. Esse movimento é o que Souza Santos (2004) chama de crise
do paradigma da ciência moderna.
O autor cita
o avanço das áreas das ciências biológicas e físicas (em especial das
quânticas) para demonstrar que o excessivo rigor outrora pensado não é mais o
único instrumento suficiente para responder aos anseios da verdade e
conhecimento buscados. A mecânica quântica e os teoremas de Godel, por exemplo,
irão fazer repensar os rigores da matemática e sua capacidade de medição dos
objetos, surgindo também, assim, um novo reformular da própria relação
sujeito-objeto nas ciências.
Sousa Santos
(2004) toma, porém, cuidado enunciando que o que se pretende não é jogar por
terra todo o arcabouço construído até a ciência moderna. O que o autor comunica
é a necessidade de um novo paradigma (nomeado emergente) que faça uma abertura
de conversa entre diferentes modos de conhecimento, contextualizando cada qual
para que não haja sobreposições e subordinações entre os mesmos.
Essa
conversa entre as ciências e modos de conhecimento, porém, não é realizada sem
tensão. Latour (1998) em um artigo para a Folha de São Paulo comenta sobre a chamada
“guerra das ciências”, ocorrida no século XX. Este período foi marcado pelo
conflito entre as ciências naturais e as ciências sociais que reivindicavam
para cada si uma superioridade sobre a outra.
Sousa Santos
(2004), porém, identifica que essa guerra atualmente está em descontinuidade.
Cita ele que um dos motivos prováveis foi que essa guerra foi travada não
especificamente com motivos pelo domínio da ciência, mas sim, talvez, por
motivos mais políticos e culturais do que científicos, com discussões entre
escolas de pensamentos e ideologias diferentes. A estagnação se deu quando os
cientistas, políticos que não o são, resolveram voltar para seus estudos e
atentar-se, de novo, para a ciência. Porém, de fundamental importância, essa
tensão histórica abriu caminhos para demonstrar a necessidade de se atentar
para uma multidisciplinaridade de conhecimentos na resolução dos problemas.
Além disto, na utilização de metodologias, pensamentos científicos e
classificações epistemológicas adequadas a cada natureza de problema, não sendo
possível uma rigidez e formatação única antes pensada na ciência moderna.
O paradigma
emergente, portanto, pensado por Sousa Santos (2004) é uma alteração no curso
moderno da ciência. A pós modernidade aqui idealizada obriga o intercâmbio de
informações e pensamentos, algo que a sociedade hoje parece já estar habituada
com seus afazeres vivenciais. É perfeitamente possível hoje viajar a passeio em
um continente, tratar-se de uma enfermidade em outro, estabelecer residência
profissional em outro possuindo raízes familiares em outro, por exemplo. Essa
mistura de possibilidades na “vida real” pode ser analogamente levada para o
“laboratório” onde as experiências de diversas formas de cultura, visões,
jeitos e trejeitos, pensamentos, razões contribuem para um saber
multiculturalizado e aplicado a cada situação.
Este
acontecimento, esta mudança, porém, pode se voltar contra si-mesma em um futuro
(talvez mais ou menos próximo). Repensa-se o seguinte: uma mudança de paradigma
desta magnitude justamente mostra que não há verdade absoluta e que a crítica a
um modelo estabelecido é válida apresentados os argumentos logicamente
construídos; portanto, pode este modelo, mais aberto e heterogêneo, não ser
questionado também? O que garante o avanço da própria Ciência nestes moldes? O
ideal de se ter justamente uma pluralidade de ideias é suficiente para as
respostas hoje pretendidas? E futuramente, uma vez já considerados o
intercâmbio de conhecimentos, para onde pode-se expandir?
Referências:
LATOUR, Bruno. Questionamento de
verdades universais põe em xeque o saber tradicional: A guerra das ciências.
Folha de São Paulo. São Paulo, nov. 1998. Tradução de: José Marcos Macedo. Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs15119803.htm>. Acesso em: 12
mar. 2018.
NUNES, J.A. Um discurso sobre as
ciências 16 anos depois. In: SOUSA SANTOS. B. Conhecimento Prudente para uma
Vida Decente. São Paulo: Cortez, 2004, p. 59-62.
SOUSA SANTOS, B. Introdução In:
SOUSA SANTOS. B. Conhecimento Prudente para uma Vida Decente. São Paulo:
Cortez, 2004, p. 17-27.
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