Dar boas razões a uma afirmação
ou uma conclusão que se faz acerca da realidade, justificando-as, é um
procedimento fundamental tanto na vida prática quanto na vida intelectual. Geralmente
precisamos convencer outras pessoas para conseguir coisas. Na ciência, uma afirmação
somente pode ser tida por verdadeira se bem justificada. Um tribunal somente
pode condenar alguém se a dúvida quanto a sua culpabilidade for mitigada. A
lista é extensa. No entanto, se refletirmos melhor, veremos que muitas das
afirmações que fazemos ou são muito intuitivas ou não carecem de justificação. Nem
sempre precisamos nos justificar aos nossos amigos e companheiros mais íntimos.
As vezes é obvio que que as aranhas têm oito pernas. Mas outras afirmações
imediatamente nos aparecem ao espírito como carentes de justificação. Porque
isso ocorre? Eis que se abre uma questão propriamente filosófica, que é a de nos
questionarmos sobre o porquê certas afirmações de realidade exigem uma
reconstituição racional. Em muitos casos somos levados a listar razões para que
levem a crer no que afirmamos. É preciso expor argumentos em favor de uma afirmação.
Nos termos da lógica, devemos demonstrar (ou deduzir) uma determinada afirmação.
Mas
afinal, se acabei de apontar a causa formal e final de um argumento (o que é...
para onde se dirige...), qual é sua estrutura interna? Em geral, a estrutura
argumentativa pode ser dividida entre o conteúdo que vem antes e o que vem após
a palavra “logo” (em gramática, é uma conjunção coordenativa conclusiva). Esta
palavra tem por função lógica indicar que uma determinada afirmação “se segue”
de uma primeira, ou de que a primeira sentença é uma boa razão para aceitar a
segunda. A estrutura geral, que é
composta pelo que vem antes (as premissas), o conectivo “logo”, e o que vem
depois (a conclusão) é chamada em Lógica de “argumento”. Em outros termos, os
argumentos são um conjunto de sentenças, nas quais apenas uma é chamada de
conclusão e as demais são premissas, sendo estas as que justificam, evidenciam
ou asseguram a conclusão.
Disso
desdobra-se um pequeno problema. O de refletirmos se todas as formas sentenciais
são permissíveis à construção de um argumento. Se conferirmos no Aurélio,
veremos que uma sentença é a sequência de palavras com ao menos um verbo
flexionado. Por exemplo, “Hoje fez sol em Florianópolis” é uma sentença. Mas
nem toda sentença pode fazer parte de um argumento. É uma regra de ouro da lógica
o fato de que tanto a conclusão quanto as premissas sejam sentenças que possam
ser julgadas por nosso juízo em termos de verdadeiro ou falso. O exemplo que
dei se enquadra nas regras, pois muito facilmente podemos afirmar com base na
experiência que hoje na cidade fez sol. Do ponto de vista da lógica, somente
sentenças declarativas interessam, aquelas que podemos afirmar e/ou negar. Mas
uma sentença declarativa pode ser “agora está estrelado”. Neste caso, tomando-a
fora de qualquer contexto é impossível dizer se é verdadeira ou falsa, podendo
até mesmo ser verdadeira e falsa. Pode estar estrelado em Florianópolis, mas nublado
em Blumenau. Enquanto na lógica dialética isso pode até ser possível, na lógica
tradicional isso se mostra um problema. Neste momento de raciocínio,
interessa-nos apenas a tradicional. Algo não pode ser verdadeiro e falso ao
mesmo tempo, pois se choca com o princípio aristotélico da não-contradição. Ou
é verdadeiro ou falso. Mais especificamente, as sentenças declarativas precisam
ser proposições se quiserem passar pelo crivo do princípio fundante da lógica tradicional.
A proposição é tudo o que é uma sentença declarativa, com a especificidade de
ser além disso uma asserção bem clara sobre o mundo (no sentido de realidade).
Somente as proposições podem ser verdadeiras ou falsas.
Por Daniel Ouriques Caminha
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